Com o filho diagnosticado com um linfoma maligno em 1994, a vida de Verci Andreo Bútalo, hoje com 76 anos, mudou da água para o vinho. Ela poderia ter encarado a situação com pessimismo, mas decidiu unir todas as suas forças para ajudar outras pessoas que passavam pelo mesmo sofrimento.
Ao lado do marido Gilberto Bútalo, Verci fez muito mais do que fundar o Grupo em Defesa da Criança com Câncer (Grendacc). Ela construiu um porto seguro em Jundiaí para crianças, que antes tinham que se deslocar até São Paulo ou Campinas para realizarem seus tratamentos. História bonita, mas não foi tão simples quanto parece.
Tudo começou com pequenas ações de ajuda mútua. “Durante o tratamento do meu filho, acabamos conhecendo outras famílias que também vivenciavam casos de câncer. Então sempre que possível eu visitava esses pais com o meu marido para nos fortalecermos juntos e trocarmos palavras de afeto”, relembra.
Em poucos meses, essas visitas resultaram em um grupo de pais voluntários unidos contra o câncer. “Eu não tinha ideia da dimensão que isso tomaria. No começo, por volta de 1996, nós nos reuníamos em uma pequena sala perto do Tênis Clube, no bairro Chácara Urbana. No mesmo ano, realizamos um encontro no Senac para recrutar voluntários e conseguimos mais de 200 pessoas interessadas”, compartilha.
Verci ressalta que inúmeras pessoas contribuíram para essa jornada. Uma delas foi a médica Maria José Mastelaro. “Essa pediatra oncologista havia trabalhado por muitos anos no Hospital Boldrini, em Campinas. Fiquei sabendo que ela estava em Jundiaí, então nosso grupo entrou em contato com ela e aceitou se juntar a nós”, conta.
No entanto, nessa época o Grendacc ainda não possuía recursos suficientes para oferecer o tratamento completo a essas crianças, mas era apenas uma questão de tempo. Com o passar dos anos, a instituição cresceu e conseguiu construir o seu próprio ambulatório, que hoje oferece não só serviços assistenciais psicológicos, odontológicos e terapêuticos, como também a possibilidade de internação e realização de cirurgias, no Hospital da Criança.
DIFICULDADES
Contudo, nem só de momentos felizes é feita a história de Verci. Seu filho Cristiano, que foi a grande motivação para a criação do Grendacc, conseguiu se curar do câncer, mas em 2014, aos 41 anos, ele sofreu um acidente de carro e não resistiu. “Foi muito difícil perder meu caçula, inclusive, muitas pessoas acharam que eu jogaria tudo para o alto, mas não fazia sentido. Eu fiz tudo o que eu pude por ele durante sua vida, então eu seguiria fazendo o que eu pudesse pela vida de outras pessoas com câncer”, diz a mãe.
Três anos depois, em 2017, Verci passou por outro entrave. Com poucas parcerias e altos custos para manter a instituição, o Grendacc acumulou uma dívida de R$4 milhões e quase teve que fechar as portas, porém, graças a verba proveniente da habilitação pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para se tornar uma Unidade de Assistência de Alta Complexidade (Unacon), ao lado de convênios fechados com a Prefeitura de Jundiaí e de cidades vizinhas, a instituição conseguiu prosseguir com as suas atividades.
SUPERAÇÃO
Assim como as dificuldades devem ser enfrentadas, as vitórias não podem deixar de ser celebradas. Foi pensando nisso que no início deste ano, o Grendacc lançou o “sino da superação”. “Tocar o sino é um símbolo de vitória para as crianças que conseguem terminar os seus tratamentos e vencer a batalha contra o câncer”, compartilha Verci.
E completa. “Para mim não existe nada mais emocionante do que receber o abraço e o agradecimento de uma mãe que teve seu filho curado”, diz emocionada.
NOVA FASE
Após 25 anos conduzindo a instituição, Verci ajudou inúmeras crianças com câncer. Muitas se curaram, outras infelizmente não resistiram. Agora, ela decidiu passar essa responsabilidade adiante. “Há tempos tenho pensado em me afastar. O Grendacc precisa de alguém mais jovem e com mais energia para fechar novas parcerias e promover ainda mais o crescimento do nosso grupo”, declara a fundadora, com o sentimento de missão cumprida e que já está passando todos os ensinamentos à sua sucessora, Isabela Bastos Cardoso.
Ela ressalta que toda essa jornada a ajudou na construção de caráter e que hoje, sem dúvidas, ela é uma pessoa melhor. “Eu aprendi muito sobre a doença, mas mais do que isso, eu aprendi sobre a forma como lidar com as pessoas. Inclusive, há um livro chamado “O câncer como ponto de mutação” que fala justamente sobre a forma como a doença transforma o nosso olhar em relação ao mundo”, conta Verci alegando que, mesmo fora da direção, faz questão de continuar presente como voluntária.
VOLUNTARIADO
Hoje o Grendacc conta com 203 voluntários, além de 123 profissionais fixos da área de saúde que contribuem no tratamento contra o câncer. Atualmente, 12 pacientes estão em tratamento, mas ao longo desses 25 anos, inúmeras crianças já passaram pela instituição.
Em função da pandemia, os voluntários tiveram que ser afastados e as doações também apresentaram uma queda. Para aqueles que puderem ajudar, o Grendacc possui um link para doação online. Acesse para contribuir: www.vakinha.com.br/vaquinha/hospital-do-grendacc